Sínteses https://sinteses.blogfolha.uol.com.br Da Idade da Pedra à 'febre do grafeno', um blog sobre tudo aquilo de que o mundo é feito Sun, 21 Mar 2021 19:10:18 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Nanomateriais apoiam tratamento de água com resíduos industriais https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2021/03/21/nanomateriais-apoiam-tratamento-de-agua-com-residuos-industriais/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2021/03/21/nanomateriais-apoiam-tratamento-de-agua-com-residuos-industriais/#respond Sun, 21 Mar 2021 19:10:18 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/eta-300x215.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=174 O acesso a água de qualidade é um dos maiores problemas globais, com mais de dois bilhões de pessoas expostas à escassez hídrica e à falta de acesso a água potável. Além da demanda crescente e da escassez agravada pelas mudanças climáticas, a poluição das fontes de água doce disponíveis, crescente nas duas últimas décadas, é um dos grandes desafios a serem enfrentados. Segundo as Nações Unidas, cerca de 400 milhões de toneladas de metais pesados, solventes, lodo tóxico e outros resíduos industriais chegam às águas do nosso planeta anualmente.

Novos poluentes, classificados como emergentes, não são removidos pelas tecnologias de tratamento de água existentes. Por isso, pesquisadores em todo o mundo têm buscado alternativas mais eficientes, envolvendo novos materiais. No Brasil, diferentes grupos de pesquisa trabalham com uma variedade de técnicas e, neste Dia Mundial da Água (22/3), destaco dois trabalhos que, apesar de muito diferentes, têm em comum o processo de adsorção (adesão de moléculas de um fluido a uma superfície sólida).

Elias Paiva Ferreira Neto busca nanomateriais capazes de degradar poluentes por fotocatálise (fotocatalisadores) desde o doutorado, realizado junto ao Grupo de Materiais Híbridos e Inorgânicos do Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP). Na fotocatálise, a luz de uma fonte natural (luz do Sol) ou artificial, ao ser absorvida pelo material catalisador, desencadeia reações químicas que podem transformar poluentes orgânicos –como o corante azul de metileno, testado por Ferreira Neto em sua pesquisa mais recente— e inorgânicos –como metais pesados– em substâncias inócuas ou, pelo menos, muito menos tóxicas ao organismo humano.

O pesquisador estudou o fotocatalisador dissulfeto de molibdênio (MoS2). Para a aplicação em situações reais, no entanto, era necessária a possibilidade de construir objetos macroscópicos com as propriedades do nanomaterial. Já no pós-doutorado, no Laboratório de Materiais Fotônicos do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Ferreira Neto encontrou a solução em uma das especialidades do grupo de pesquisa, a celulose bacteriana.

Juntando as duas abordagens – ao revestir a celulose bacteriana com uma camada do fotocatalisador –, o pesquisador chegou a uma membrana capaz de descontaminar a água que passa por ela, removendo, por filtragem e degradação, poluentes orgânicos e inorgânicos. Uma das principais vantagens do novo material é a possibilidade de reutilização, já que muitas das alternativas existentes precisam ser aplicadas como pó ou suspensão, o que inviabiliza sua recuperação após o uso.

Produzida por alguns tipos de bactérias, a celulose bacteriana forma um hidrogel composto por 99% de água que, ao passar por um processo de secagem controlada, se transforma em um aerogel. No aerogel, a água é substituída por ar, resultando uma estrutura muito porosa que, ao mesmo tempo, permitem a passagem da água e retém – por adsorção – os poluentes. Conforme ficam retidos na membrana, os poluentes são então degradados pelo fotocatalisador.

Nos testes já realizados, a membrana removeu da água, durante um experimento de duas horas, 96% do azul de metileno e 88% do metal cancerígeno crômio VI (crômio no estado de oxidação VI, referente à sua carga elétrica), ambos comuns em efluentes industriais da produção têxtil e de couro, por exemplo. O trabalho segue na busca de maior eficiência – inclusive com o uso de outros fotocatalisadores e testando outros contaminantes – e, também, da caracterização dos produtos resultantes da degradação.

“Nosso resultados evidenciam a importância da colaboração científica, já que não teriam surgido se não tivéssemos combinado as especialidades de dois grupos diferentes, o trabalho com fotocatalisadores, no caso da USP, e celulose bacteriana, na Unesp”, destaca Ferreira Neto.

A segunda pesquisa também foi realizada em parceria, entre o Laboratório de Materiais Poliméricos e Biossorventes da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e o Laboratório de Ciências Integradas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Nela, o material adsorvente usado foi o bagaço de cana, um dos principais resíduos da agroindústria brasileira, resultante da atividade nas usinas de etanol e açúcar. O bagaço – um biossorvente, adsorvente de origem biológica – foi usado em um compósito com nanopartículas de magnetita sintética, combinando as propriedades adsorventes do bagaço às propriedades magnéticas das nanopartículas.

Com isso, o bagaço retém, por adsorção, os poluentes – no caso deste estudo, foram testados cobre e o mesmo cromo VI – e, depois, é retirado da água pela ação de um imã que atrai as nanopartículas magnéticas do compósito. Também neste caso o grupo de pesquisa segue testando este e outros compósitos biossorventes em relação à capacidade de retenção de outras moléculas orgânicas e inorgânicas. As pesquisas já mostraram, também, potencial para remoção de óleos da superfície das águas em caso de derramamento.

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Nanobastões de ouro podem ajudar diagnóstico de doenças como Alzheimer https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2021/02/25/nanobastoes-de-ouro-podem-ajudar-diagnostico-de-doencas-como-alzheimer/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2021/02/25/nanobastoes-de-ouro-podem-ajudar-diagnostico-de-doencas-como-alzheimer/#respond Thu, 25 Feb 2021 19:31:36 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2021/02/nanobastoes-300x215.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=166 Nanobastões de ouro são um material conhecido, com propriedades ópticas úteis à aplicação no tratamento de doenças como alguns tipos de câncer, na chamada terapia fotodinâmica. Cientistas do Brasil, Estados Unidos e China mostraram que, combinadas a moléculas análogas a proteínas existentes no nosso corpo, essas nanoestruturas podem ajudar ainda mais a compreender, diagnosticar e buscar novos tratamentos para uma variedade importante de doenças.

Os pesquisadores combinaram os nanobastões a peptídeos sintéticos –pequenas proteínas, identificados pela sigla hIAPP– muito semelhantes a peptídeos presentes no corpo humano saudável mas que, alterados, estão na origem de condições tão diversas quanto câncer de pâncreas, diabetes tipo 2, Alzheimer e Parkinson. A alteração se dá pela mudança na conformação dessas moléculas e sua consequente agregação, formando as chamadas placas amiloides que, em pessoas com Alzheimer ou Parkinson, impedem o bom funcionamento de neurônios, por exemplo.

Em humanos e, também, em modelos animais usados nos testes para desenvolvimento de novas drogas, a formação dessas placas pode levar meses ou anos. A interação entre os nanobastões de ouro e os peptídeos acelerou este processo, agora mimetizado no laboratório em poucas horas. Com isso, fica mais rápido também testar quais drogas podem inibir a formação das placas e, assim, potencialmente serem úteis no tratamento das doenças.

Outro resultado foi a identificação de que a interação com os peptídeos modifica a forma como o material absorve e emite luz, levando a uma propriedade chamada dicroísmo, que é a capacidade de interagir com uma forma especial de luz, circularmente polarizada. O peptídeo sintético tem afinidade com os peptídeos presentes no nosso corpo, e a interação com a luz é diferente dependendo se o material sintetizado encontra peptídeos isolados (com estrutura de hélice), típicos de um tecido saudável, ou moléculas agregadas na forma de fibras ou placas (cuja estrutura é chamada de folha plana, associada ao desenvolvimento das doenças).

“O estudo mostrou a possibilidade de identificar justamente se os peptídeos estão na forma de hélice ou folha plana, e isto abre a perspectiva de um diagnóstico precoce, antes da doença se instalar, inclusive porque a detecção se dá também em concentrações muito baixas”, explica André Farias de Moura, professor do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) responsável pela parte brasileira da pesquisa. Outras vantagens, explica o pesquisador, são que a luz emitida é tão intensa que pode ser medida por um equipamento tão simples quanto a câmera de um telefone celular e, também, que as nanoestruturas sintetizadas interagem com a luz na região do infravermelho, o que permite observar o que acontece dentro de tecidos ou, até mesmo, dos organismos, com o mínimo de interferência de outras moléculas.

“O artigo mostra que poderemos desenvolver plataformas de busca e triagem de novas drogas não apenas com velocidade maior, mas também mais precisas, pela possibilidade de estudo diretamente nos tecidos afetados, e não em culturas de células em tubos de ensaio, por exemplo”, explica Moura.

Ele também situa que o modelo de síntese do material desenvolvido poderá servir a aplicações em cenários sequer imaginados neste momento. “É como as vacinas contra o novo coronavírus. Se a ciência básica desenvolvida muito antes de imaginarmos a ocorrência da pandemia não estivesse pronta para ser rapidamente adaptada, não chegaríamos às vacinas em menos de um ano”, compara. “No caso da nossa plataforma, se pudermos modificá-la para detectar não o peptídeo, mas as proteínas spike ou anticorpos contra o Sars-CoV-2, por exemplo, é possível testar novos fármacos, acelerar e aumentar a precisão de diagnósticos e, inclusive, inativar o vírus”, prevê.

O artigo com os resultados da pesquisa, intitulado “Enhancement of optical asymmetry in supramolecular chiroplasmonic assemblies with long-range order”, foi publicado hoje na Science. A pesquisa teve financiamento, no Brasil, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), além de utilizar os recursos do supercomputador Santos Dumont. Os parceiros nos outros países são da Universidade de Michigan, nos EUA, e da Universidade Jilin, na China.

Confira vídeo em que André de Moura apresenta seu trabalho.

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Super e semicondutor são destaques do ano, com desafios para aplicação https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/12/29/super-e-semicondutor-sao-destaques-do-ano-com-desafios-para-aplicacao/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/12/29/super-e-semicondutor-sao-destaques-do-ano-com-desafios-para-aplicacao/#respond Tue, 29 Dec 2020 19:31:36 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/12/cpu-3061923_1280-300x215.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=155 A pandemia de Covid-19 transformou completamente as listas de principais conquistas científicas em 2020, como todo o resto.

Em 2020, foram finalmente desvendadas as estruturas tridimensionais das proteínas, foram enviadas três missões a Marte e outras para buscar material na Lua e no asteroide Ryugu, e tivemos avanços importantes em estratégias para enfrentar diferentes doenças, incluindo o HIV. Mas ficou difícil competir com vacinas desenvolvidas em um décimo do tempo normalmente empregado e com todo o conhecimento produzido sobre um vírus e uma doença absolutamente desconhecidos há apenas um ano.

Mesmo com toda esta disrupção, não há entre as tradicionais listas do tipo –como nas publicadas pelas revistas Nature e Science— uma que não registre a produção do primeiro material supercondutor em temperatura ambiente, ainda que fora do topo e sem a alcunha de “descoberta científica do ano”.

Assim como a emergência de uma pandemia a partir de uma zoonose, a obtenção do novo material não foi exatamente uma surpresa. Outras listas, do final de 2019, sobre o que esperar da ciência em 2020, registravam a expectativa. E, neste caso, a mudança de foco para a Covid-19 parece não ter afetado o trabalho na área.

Juntando hidrogênio, carbono e enxofre, os cientistas observaram a supercondutividade em temperaturas de até cerca de 14ºC. A supercondutividade foi compreendida como propriedade exclusiva das baixíssimas temperaturas desde 1911, quando descoberta, até 1986, ano de início da escalada até as primeiras temperaturas acima dos 0ºC reportadas em outubro deste ano.

Além de ser um avanço incremental e esperado, construído ao longo de décadas, há um outro motivo para a conquista parecer um pouco morna (sem intenção de trocadilho!): o material foi obtido a uma pressão mais de 2,5 milhões vezes maior que a do ambiente em que vivemos, produzida entre as garras de uma espécie de pinça de diamante. Ainda longe, portanto, das fantásticas aplicações previstas para supercondutores em temperatura ambiente, que vão de equipamentos médicos e trens ultrarrápidos de levitação magnética à extrema eficiência energética de modo geral, pela ausência de resistência à passagem da corrente nesses materiais e, assim, redução das perdas energéticas.

Fora das listas gerais, mas vencedor em concurso mais especializada promovido pela revista Physics World, um outro material obtido em 2020 compartilha com o supercondutor em temperatura ambiente não apenas os desafios até a aplicação, mas também o apelido de Santo Graal (neste caso, da indústria microeletrônica, ou melhor, optoeletrônica).

Trata-se de um nanofio de silício sintetizado com uma estrutura cristalina hexagonal (padrão de ordenamento espacial dos átomos no material), e não com estrutura do tipo diamante, como normalmente o material se apresenta.

O silício é a base de toda a indústria de microcomputadores, por suas propriedades eletrônicas (de semicondutor) associadas ao fato de ser abundante e barato. No entanto, está próximo um limite operacional importante. O crescimento do poder de processamento dos chips implica aumento no consumo de energia e, também, no calor gerado pela resistência do material, em um cenário que só poderá ser ultrapassado com a integração da fotônica –transmissão de informação pela luz, ou seja, fótons, no lugar de elétrons– à eletrônica.

E o rei da eletrônica tem um desempenho pífio quando se trata das suas propriedades ópticas. Alguns semicondutores emitem luz quando submetidos a uma corrente elétrica, como nos LEDs, mas este não é o caso do silício comum, devido a uma propriedade inerente ao material (chamada de gap indireto ou de estrutura de bandas indireta). Assim, até agora, o caminho para a incorporação da luz passa pela integração de outros materiais aos chips de silício, o que é possível, mas difícil e caro.

Com o novo material, este obstáculo pode ser superado, com aplicações potenciais também nas telecomunicações e em sensores químicos. No entanto, ainda é preciso produzir o silício hexagonal em uma superfície plana –no lugar do nanofio–, o que, segundo os pesquisadores, é só uma questão de tempo.

A virada de um ano para outro traz justamente a sensação de termos um novo tempo para superar desafios, resolver problemas e alcançar as metas estabelecidas na véspera de 1º de janeiro. Neste fim de 2020, para todo o mundo e, felizmente, para grande parte da comunidade científica, o controle da pandemia sem dúvida é a prioridade. Mas, para muitos cientistas e engenheiros de materiais, produzir supercondutores em temperatura e pressão próximas às do ambiente e lasers a base de silício deve vir logo abaixo na lista.

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Carimbo do vírus em polímero permite teste rápido de Covid na saliva https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/12/10/carimbo-do-virus-em-polimero-permite-teste-rapido-de-covid-na-saliva/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/12/10/carimbo-do-virus-em-polimero-permite-teste-rapido-de-covid-na-saliva/#respond Thu, 10 Dec 2020 18:53:30 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/12/imagemdosensor-300x215.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=148 Pesquisadores vinculados ao Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), sediado em Campinas, desenvolveram dois tipos de testes rápidos portáteis para detecção do vírus causador da Covid-19 na saliva. Os testes utilizam uma base sensora eletroquímica, na qual um material semicondutor –uma nanoestrutura de óxido de zinco– capta pequenas variações em sinais elétricos causadas pela presença do Sars-CoV-2.

No início da pandemia, o grupo liderado por Talita Mazon, pesquisadora no CTI, logo pensou em adaptar o teste originalmente desenvolvido para zika, dengue e outras doenças. “Nós trabalhamos com o óxido de zinco em biossensores há cerca de cinco anos. Estávamos na fase de validação do teste de zika e pensamos que bastava uma adaptação. Mas não tínhamos dinheiro para adquirir o antígeno e os anticorpos, e leva um tempo para as empresas conseguirem produzir um anticorpo monoclonal que resulte em teste com a especificidade desejada”, explica a pesquisadora.

Na plataforma utilizada, chamada de imunossensor, anticorpos são imobilizados na nanoestrutura e, quando entram em contato com proteínas do vírus (antígeno), a ligação química entre anticorpo e antígeno produz alterações características em sinais elétricos, que são captadas pelo material semicondutor e registradas em um gráfico no computador ou em dispositivos móveis como telefones celulares.

No entanto, anticorpos monoclonais (produzidos em laboratório) precisam ser importados e têm custo elevado, fora do alcance dos pesquisadores naquele primeiro momento. Em vez de desistir, ou ficar esperando os anticorpos chegarem, o grupo seguiu por outro caminho, que levou a uma solução ainda mais interessante, inteiramente nacional e que pode ser armazenada em temperatura ambiente, por não conter materiais biológicos.

O grupo desenvolveu um teste em que o vírus Sars-CoV-2 é impresso em uma base de polipropileno, um polímero depositado como uma camada sobre o sensor de óxido de zinco. Forma e tamanho do coronavírus são carimbados no polímero, e o material passa então por uma lavagem que elimina o vírus. Quando partículas virais presentes na saliva contaminada encaixam neste molde, também acontecem as alterações nos sinais elétricos, captadas pelo óxido de zinco. Simples assim, como nos brinquedos para crianças pequenas em que triângulos, quadrados e círculos precisam ser encaixados nos lugares correspondentes em uma base de plástico.

“O que nós medimos, com um potenciostato acoplado ao celular, ou a um laptop, é uma variação no sinal elétrico, que pode ser maior ou menor que o esperado na ausência da proteína ou do vírus. Em algumas doenças, a ligação entre anticorpo e antígeno gera uma corrente elétrica maior. No caso dos testes de Covid, essa ligação, bem como o encaixe do vírus no polímero, têm característica isolante, gerando uma corrente menor”, situa Mazon.

A impressão do polímero foi realizada a partir de vírus isolados pela equipe do Laboratório de Estudos de Vírus Emergentes da Universidade Estadual de Campinas (LEVE), coordenado por José Luiz Proença Módena. “Eu conheci o professor Módena porque as amostras de pacientes com zika foram doados pelo LEVE. Vi em uma reportagem que ele havia isolado o novo coronavírus e pedi as amostras, para tentar a impressão do vírus na camada polimérica”, relembra Mazon, explicando que, mais comumente, o que tem sido buscado é a impressão de anticorpos.

Eficácia, especificidade e sensibilidade do teste já foram comprovadas com o uso de vírus inativados, mas agora análises com vírus ativos devem ser realizadas nas instalações do LEVE, com os níveis de biossegurança necessários. “Embora o desenvolvimento deste teste esteja em uma etapa inicial, em longo prazo considero a solução muito promissora. Além de não precisar de refrigeração e da importação de anticorpos e antígenos, eles podem ser muito úteis em viroses futuras. Geralmente, uma das primeiras coisas que é feita é isolar o vírus. Assim, uma vez estabelecida a metodologia, fica fácil adaptar no caso de um novo vírus”, avalia a líder do grupo de pesquisa.

O grupo também deu continuidade ao desenvolvimento do imunossensor, a partir de parceria com startup que importou antígenos e anticorpos. Neste caso, o processo está mais adiantado, em etapa de validação pela verificação frente ao exame RT-PCR, considerado padrão-ouro na detecção do vírus. Essa verificação será feita em pacientes, no Hospital das Clínicas de Botucatu, com previsão de término até o final de janeiro e encaminhamento para aprovação e início da produção em escala.

O custo estimado para o imunossensor é de cerca de R$ 10 por teste, valor que deve ser ainda menor para o dispositivo com a camada polimérica. Os estudos são realizados em parceria também com o Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais, apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

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Espuma feita de materiais naturais remove óleo de águas contaminadas https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/12/02/espuma-feita-de-materiais-naturais-remove-oleo-de-aguas-contaminadas/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/12/02/espuma-feita-de-materiais-naturais-remove-oleo-de-aguas-contaminadas/#respond Wed, 02 Dec 2020 18:04:35 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/12/espuma-300x215.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=143 Que água e óleo não se misturam todo mundo sabe, de experiências cotidianas em casa ou na escola e das manchas no mar após grandes vazamentos. Menos conhecido é o uso, na remediação desses desastres e outros episódios de contaminação de corpos d’água, de espumas, materiais porosos e absorventes semelhantes às esponjas usadas na limpeza doméstica, capazes de conter os contaminantes separando-os da água.

Os materiais porosos –espumas, esponjas e aerogéis– geralmente usados como alternativa aos métodos convencionais de descontaminação têm a desvantagem de serem derivados do petróleo, dependendo de recursos não renováveis e não sendo biodegradáveis. Uma pesquisa realizada no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) resultou em inovação que pode substituir esses materiais, por uma nova espuma a base de celulose e látex altamente eficiente e produzida em um processo simples e limpo.

A nanocelulose já é utilizada em materiais porosos para diferentes aplicações. Algumas de suas vantagens são a abundância e o baixo custo, podendo ser obtida de biomassa como bagaço de cana ou resíduos da produção de papel. Além disso, apresenta propriedades muito adequadas à obtenção de estruturas porosas tridimensionais.

No entanto, a celulose é naturalmente hidrofílica –ou seja, tem afinidade com a água e não com os poluentes– e frágil quando molhada. Por isso, para uso na absorção de óleos e outros compostos hidrofóbicos (como tolueno e clorofórmio), geralmente são necessárias várias etapas na produção das espumas de celulose e, inclusive, o uso de solventes que podem causar danos ao ambiente.

A solução encontrada no CNPEM combinou a associação entre nanocelulose obtida do eucalipto e látex de borracha natural com um processo produtivo em etapa única. O látex confere ao material a robustez estrutural e a afinidade com os poluentes que faltam na celulose. O mais curioso, no entanto, é o caminho percorrido para obter a espuma. Os materiais sólidos –celulose e látex– representam apenas 2% de uma mistura com água que é congelada e, depois, liofilizada. Ou seja, a água passa do estado sólido (gelo) para o gasoso no processo de liofilização, deixando em seu lugar os poros que irão absorver os poluentes em uma proporção até 50 vezes maior que a massa da espuma de celulose.

As análises feitas nos laboratórios do CNPEM comprovaram a alta porosidade do material e outras características morfológicas, sua capacidade de absorção de óleo e outras substâncias e, também, sua durabilidade após vários ciclos de uso. O material desenvolvido já teve sua patente depositada e está disponível para licenciamento e aplicação como alternativa sustentável na remediação de águas contaminadas. Os resultados foram publicados em artigo de capa na edição de novembro do periódico científico internacional ACS Applied Nano Materials.

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Como transformar tijolos em baterias e a sua parede em um carregador https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/08/20/como-transformar-tijolos-em-baterias-e-a-sua-parede-em-um-carregador/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/08/20/como-transformar-tijolos-em-baterias-e-a-sua-parede-em-um-carregador/#respond Thu, 20 Aug 2020 20:13:11 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/brick-wall-pixabay-300x215.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=120 Tijolos de barro são usados para construção há milhares de anos, e raramente tiveram outras finalidades. Agora, cientistas propuseram uma aplicação que une dois dos maiores desafios tecnológicos da atualidade: materiais de construção inteligentes e, principalmente, dispositivos de armazenamento adequados à transição energética para modelos mais sustentáveis.

Os pesquisadores, da Universidade de Washington em St. Louis, nos Estados Unidos, aproveitaram três características dos tijolos: porosidade, resistência mecânica e a presença de hematita (Fe2O3, óxido de ferro, ou a popular ferrugem). A partir delas, testaram uma rota de síntese para transformar pares de tijolos em eletrodos e, assim, armazenar energia, como em uma bateria.

Mais precisamente, a transformação resulta em um supercapacitor, mas quem sabe o que é um supercapacitor (eu, ao menos, desconhecia até bem pouco tempo atrás)?

Supercapacitores, como as baterias, são dispositivos para armazenar energia. No entanto, cada um tem suas propriedades e, assim, diferentes aplicações. Baterias armazenam maiores quantidades de energia, e supercapacitores são mais rápidos na carga e descarga. Em um veículo elétrico, por exemplo, supercapacitores são responsáveis pela entrega rápida da energia necessária ao início do movimento, mas quem mantém o carro andando é a energia armazenada nas baterias.

Outra vantagem dos supercapacitores é a sua durabilidade, já que suportam mais ciclos de carga e descarga. No caso dos tijolos, os pesquisadores estimaram essa capacidade em até 10 mil ciclos.

Embora chame a atenção o produto final, ou seja, o tijolo-supercapacitor, o principal resultado do estudo, publicado recentemente no periódico Nature Communications, é mostrar a viabilidade da rota de síntese. A rota adotada resulta na deposição de nanofibras de um polímero condutor de energia na superfície do tijolo e, assim, em um revestimento plástico que possibilita o armazenamento dessa energia.

Nesse processo – chamado de síntese em fase de vapor –, ácido clorídrico (HCl) vaporizado passa pelos poros do tijolo e interage com a hematita liberando um íon de ferro (Fe3+). Assim, é desencadeada a polimerização de monômeros (chamados de EDOT e disponíveis também como vapor) por uma rota que leva à deposição de um polímero (PEDOT, com o P acrescentado vindo justamente de polímero) com as características desejadas: baixa resistência elétrica e estabilidade química e física.

Polimerização é o nome dado justamente à reação química que leva moléculas menores, os monômeros, a formarem cadeias maiores, os polímeros. São várias as formas de polimerização e, neste caso, o controle da reação para que se obtivesse o material condutor e estável foi o grande avanço da pesquisa.

Novos materiais – e novas rotas de síntese para materiais já existentes – são centrais no desenvolvimento de dispositivos de armazenamento que concretizem todo o potencial de fontes mais limpas de energia, como a solar e a eólica. A pesquisa da Universidade de Washington é um avanço nesta direção, embora seja o que se chama, em ciência, de prova de conceito, uma vez que o supercapacitor testado acendeu apenas uma pequena lâmpada de LED.

No entanto, segundo os autores, o método é escalonável, viável economicamente e versátil. Algumas das aplicações já sugeridas são na alimentação de sensores, etiquetas (tags) de sistemas de comunicação RFID (identificação por rádio frequência), microrrobôs e outros microdispositivos embutidos em edifícios e cidades inteligentes.

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Pesquisa desvenda como nanopartículas de ferro descontaminam aquíferos https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/06/30/pesquisa-desvenda-como-nanoparticulas-de-ferro-descontaminam-aquiferos/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/06/30/pesquisa-desvenda-como-nanoparticulas-de-ferro-descontaminam-aquiferos/#respond Tue, 30 Jun 2020 18:41:42 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/06/aquifero.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=117 Hidrocarbonetos clorados estão entre os contaminantes mais persistentes em reservas de águas subterrâneas – aquíferos – em todo o mundo. Quantidades muito pequenas destes poluentes são suficientes para tornar a água imprópria para consumo humano, por causarem danos aos rins, fígado e, também, câncer.

O problema é característico de regiões industrializadas, pois as substâncias foram muito usadas como solventes, desengraxantes, em esmaltes para pintura de automóveis e na lavagem a seco, dentre outras aplicações. “Há, na cidade de São Paulo, por exemplo, áreas em que a subsuperfície inteira está contaminada”, relata Nathaly Lopes Archilha, do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), que estuda a nanorremediação da contaminação por hidrocarbonetos clorados.

Embora o uso hoje seja rigidamente controlado, vazamentos aconteceram no passado pelo manuseio e armazenamento incorretos e, também, pela destinação inadequada de resíduos. As tecnologias usuais de remediação envolvem o tratamento da água depois de ser trazida à superfície, o que, além do custo, não resolve totalmente o problema. “Por serem mais densos que a água, os hidrocarbonetos clorados, se descartados em solo permeável, afundam até chegar em um leito menos permeável, geralmente o leito de um aquífero”, explica Archilha. “Como eles persistem na subsuperfície por muitos anos, nos poros das rochas, e vão sendo lentamente carregados pelas águas, estamos pagando até hoje o preço de um problema gerado há 50 anos”, situa.

A nanorremediação aparece, assim, como possibilidade de tratamento no próprio aquífero e, também, de atingir estas fontes secundárias de contaminação, os resíduos “capturados” nos poros dos leitos dos aquíferos. Por exemplo, nanopartículas de ferro, um elemento muito reativo, são injetadas no aquífero justamente para reagirem com os poluentes, provocando sua degradação. Embora este efeito já seja conhecido, ainda não se sabia como a reação ocorre em condições similares às de um aquífero real, ou seja, o que acontece nos poros durante a interação entre nanopartículas e contaminantes.

Para descobrir, foi desenvolvida pesquisa usando a tecnologia de tomografia de raios X disponível no Laboratório Nacional de Luz Sincrotron (LNLS), vinculado ao CNPEM. O conhecimento produzido viabilizará, por sua vez, o desenho de estratégias otimizadas de nanorremediação, além de subsidiar a regulamentação dessas técnicas. “Alguns países ainda não usam a tecnologia e um dos motivos é justamente não saberem o que acontece nessas condições. Se vão injetar nanopartículas de ferro, super reativas, precisam saber o que vai acontecer, entender os mecanismos de ação”, ilustra a pesquisadora.

Os pesquisadores simularam os grãos e poros das rochas com uso de pequenas esferas de vidro e, utilizando o acelerador de partículas do LNLS, em Campinas (SP), produziram imagens em quatro dimensões (4D) com resolução suficiente para enxergar os diferentes líquidos dentro dos poros. Em outras palavras, produziram imagens com altura, profundidade e largura (3D) ao longo de um intervalo de tempo (a quarta dimensão). Obtiveram, assim, uma espécie de “filmagem” da interação entre as nanopartículas de ferro e o tricloroetileno (TCE) – membro da família dos hidrocarbonetos clorados adotado no estudo –, em ambiente simulando processos de remediação já empregados em águas subterrâneas.

Analisando as imagens, a equipe identificou dois processos distintos. O primeiro foi a verificação do que já se sabia sobre a reação química entre as nanopartículas e o TCE, que produz um gás. “Nós verificamos a degradação, observando que, ao mesmo tempo que a quantidade de TCE diminuía, gás era formado ao redor”, explica Archilha. “Mas, às vezes, o volume inteiro de TCE desaparecia da imagem, o que não é condizente com o processo de degradação, mais lento. Neste caso, o TCE estava sendo arrastado, e não degradado”, conta a pesquisadora.

A conclusão do estudo é que o uso das nanopartículas é eficiente na remediação de fontes persistentes de contaminantes em subsuperfície. Além disso, a pesquisa revelou que o gás formado, ao se movimentar em direção a regiões de menor pressão, carrega com ele quantidades de TCE, o que não necessariamente é bom para o processo de remediação. “Se muito TCE for arrastado, o resultado pode ser a chegada da substância a uma área que antes não estava contaminada. Por isso, conhecendo esse mecanismo, é possível, por exemplo, otimizar a velocidade de injeção ou a concentração de nanopartículas para controlar a produção do gás”, explica Archilha.

Na pesquisa já realizada, a linha de luz então disponível no LNLS permitiu a observação de poros micrométricos. Para o futuro, com a inauguração do novo acelerador, o Sirius, o grupo pretende investigar o que acontece também na escala nanométrica. “Um dos problemas desses contaminantes é que eles chegam até poros muito pequenos, e nós queremos verificar o que acontece nesta escala”, conta a pesquisadora do CNPEM. “O Sirius também trará maior resolução temporal, além da espacial. O máximo que nós conseguíamos com o antigo acelerador era uma imagem a cada seis minutos. No Sirius, será possível produzir uma imagem por segundo”, complementa. “No caso do arraste do TCE pelo gás, por exemplo. Na pesquisa que fizemos, em uma imagem o TCE estava lá e, na outra, tinha sumido. Agora nós devemos conseguir ver o que aconteceu entre esses dois pontos”, conclui.

Os resultados obtidos estão no artigo intitulado “Pore-scale investigation of the use of reactive nanoparticles for in situ remediation of contaminated groundwater source”, publicado no dia 16 de junho no periódico PNAS. Além de Archilha, assinam o artigo outros dois pesquisadores do CNPEM e parceiros da Teesside University, no Reino Unido, do Politecnico di Torino, Itália, e da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

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Tecido desenvolvido no Brasil tem ação contra Sars-CoV-2 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/06/16/tecido-desenvolvido-no-brasil-tem-acao-contra-sars-cov-2/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/06/16/tecido-desenvolvido-no-brasil-tem-acao-contra-sars-cov-2/#respond Tue, 16 Jun 2020 22:15:04 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/06/tecido_prata.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=112 Há quem diga que coincidências não existem. Mas é curioso que, exatamente dois meses depois de sumir daqui, tragada por esforços de divulgação relacionados à Covid-19 (dentre eles um podcast publicado diariamente sem interrupção há exatos 93 dias!), retorne justamente complementando o texto com o qual me despedi.

Em 16 de abril, contei como uma empresa de base tecnológica brasileira e um fabricante de brinquedos se juntaram para produzir máscaras reutilizáveis com ação comprovada contra fungos e bactérias. Agora, a mesma empresa, a Nanox, comprovou também a ação dos materiais que desenvolve contra o Sars-CoV-2, vírus causador da Covid-19.

O resultado foi submetido nesta terça-feira (16), em “preprint”, ao repositório bioRxiv, ainda sem revisão por pares, em uma colaboração da Nanox com pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF) e do Laboratório de Química Teórica e Computacional da Universidade Jaume I, na Espanha.

Partículas de prata foram adicionadas a tecidos comuns – o chamado poli-algodão, mistura de algodão e poliéster, recomendado pela Organização Mundial da Saúde para a confecção de máscaras. Experimentos verificaram a integridade estrutural do tecido após a aplicação e, também, a segurança dermatológica do material, que não causou alergias ou irritação na pele nos testes realizados com seres humanos.

E, claro, o mais importante: foi verificada a capacidade do tecido de inativar até 99,99% das partículas virais de Sars-CoV-2 cultivadas em células humanas, em apenas dois minutos. O material também elimina bactérias e fungos, o que evita, por exemplo, a contaminação cruzada.

Os responsáveis pelo estudo vislumbram diferentes possibilidades de aplicação, que vão das máscaras de tecido e roupas hospitalares até artefatos de cama, mesa e banho usados em nossas residências. Negociações já estão em andamento com fabricantes desses produtos, conta Gustavo Simões, CEO da Nanox.

As pesquisas continuarão com testes em outras superfícies, como plásticos. Elson Longo da Silva, Diretor do CDMF, destaca a relevância de uma trajetória de mais de 30 anos na obtenção do resultado em tão curto espaço de tempo no contexto da pandemia. “É a pesquisa básica que resulta na compreensão e no conhecimento a partir dos quais é possível desenvolver um produto. Esta tecnologia só existe agora porque, ao longo do tempo, fomos compreendendo como funcionam os semicondutores”, afirma o pesquisador. “E, neste caso, tivemos a coroação da pesquisa. As máscaras reutilizáveis que já estão sendo comercializadas têm os mesmos aditivos agora testados contra o Sars-Cov-2. Ou seja, fizemos o produto, comprovadamente bactericida e antifúngico, antes mesmo de comprovar também a ação antiviral”, comemora.

As pesquisas realizadas pelo CDMF têm apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), financiadora também de projetos de desenvolvimento e inovação da Nanox. A empresa também recebe recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

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Máscara com função bactericida e antiviral é fabricada no Brasil https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/04/16/mascara-com-funcao-bactericida-e-antiviral-e-fabricada-no-brasil/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/04/16/mascara-com-funcao-bactericida-e-antiviral-e-fabricada-no-brasil/#respond Thu, 16 Apr 2020 13:42:31 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/mascara.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=108 Uma fabricante de brinquedos e uma empresa de base tecnológica nascida em laboratórios universitários anunciaram na manhã desta quinta-feira (16) o início do desenvolvimento, em parceria, de máscaras respiratórias reutilizáveis, produzidas com materiais com propriedades bactericidas, antifúngicas e antivirais.

A Elka, fabricante de brinquedos, buscava uma forma de empregar seu parque fabril ocioso devido à pandemia de Covid-19 no combate à própria pandemia. Por meio de um parceiro em comum, encontrou a Nanox, especializada em aditivos nanoestruturados a base de prata com ações antimicrobianas comprovadas — bactericidas, antifúngicas e antivirais.

As duas empresas desenvolveram, então, o projeto de uma máscara de proteção reutilizável equivalente às hoje famosas N95 (que são descartáveis), com uma vantagem adicional: superfícies ativas que podem ajudar no combate a infecções bacterianas responsáveis pelo agravamento de quadros de Covid-19.

“As micropartículas que produzimos têm ação comprovada contra alguns tipos de vírus. Ainda não houve tempo para os testes com o SARS-CoV-2, mas o potencial existe”, esclarece Gustavo Simões, CEO da Nanox. “Mas, além da produção nacional e do fato de serem reutilizáveis, a ação bactericida pode contribuir na prevenção de outras infecções, especialmente a pneumonia bacteriana, frequentemente associada ao agravamento dos quadros de Covid-19”, complementa.

As máscaras — que receberam a marca Oto — são produzidas com materiais plásticos (poliméricos) associados aos aditivos da Nanox, com espaço para filtros PFF2 descartáveis. Nesta primeira etapa, os aditivos estão apenas na estrutura das máscaras, mas já está prevista a adição aos filtros. Para a higienização, é necessário usar apenas água e sabão. “O protocolo para substituição dos filtros precisará ser estabelecido pelos serviços de saúde. De qualquer forma, sejam eles quais forem, a quantidade de material necessário para a confecção das máscaras é muito inferior ao que é usado nas máscaras descartáveis”, explica Simões.

A fase de pré-reserva foi iniciada hoje, e as primeiras unidades serão entregues a partir de 12 de maio. Inicialmente, a capacidade de produção é de 200 mil unidades por mês, mas a quantidade pode ser facilmente aumentada diante da demanda, para até um milhão de unidades mensais, segundo os responsáveis pela iniciativa. A expectativa é fornecer principalmente para serviços hospitalares, e uma parte será destinada a doações. “Já está definido que até 10% da produção será doada, e estamos construindo os mecanismos para essa possibilidade”, afirma Simões.

Eduardo Kapáz Jr, da Elka, destaca o fato da máscara ter sido desenhada e ser produzida totalmente no Brasil, e de servir, segundo ele, não só aos agentes de saúde na linha de frente no combate à pandemia, mas também à população em geral.

A Nanox é uma spin-off do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Em 2004, a partir de demanda apresentada por uma fabricante de eletrodomésticos, estudantes que realizavam pesquisas de iniciação científica e mestrado no Centro vislumbraram a oportunidade de empreender na área de materiais baseados em nanotecnologia, à época quase inexistente no Brasil.

Na sua consolidação, a empresa recebeu recursos da própria Fapesp e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). “Nada disso seria possível sem o conhecimento acumulado ao longo da minha formação e das outras pessoas envolvidas, e bem antes disso, com recursos públicos. É essa experiência acumulada que agora pode ser rapidamente redirecionada para este objetivo emergencial, para um problema real. É a concretização de investimentos na promoção do relacionamento entre universidade e empresas, por exemplo”, avalia o CEO da Nanox.

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Vírus complexo: partículas sintéticas ajudam a entender o Sars-CoV-2 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/04/09/virus-complexo-particulas-sinteticas-ajudam-a-entender-o-sars-cov-2/ https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/2020/04/09/virus-complexo-particulas-sinteticas-ajudam-a-entender-o-sars-cov-2/#respond Thu, 09 Apr 2020 18:04:47 +0000 https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/quiralcf.jpg https://sinteses.blogfolha.uol.com.br/?p=104 Pouco mais de três meses após as primeiras notícias sobre o Sars-CoV-2, a imagem do vírus com sua “coroa de espinhos” — responsável pelo nome de coronavírus — é familiar. Essa geometria complexa é parte importante da interação do vírus com nossas membranas celulares no momento da infecção, e compreendê-la pode ajudar no combate à Covid-19 e a outras doenças.

As mesmas leis naturais regem o surgimento da complexidade em sistemas artificiais ou biológicos, e obter partículas sintéticas análogas àquelas encontradas em seres vivos é importante no estudo desses organismos. Isso porque os materiais artificiais são menos frágeis que suas contrapartidas biológicas. Mas, enquanto na natureza a complexidade é comum, nos laboratórios a história é um pouco mais complicada.

A complexidade estrutural de materiais biológicos está relacionada à ordenação hierárquica de “blocos de construção” em múltiplas escalas, da nanométrica à macroscópica — como já vimos, aqui em Sínteses, no estudo da castanha do Pará. No entanto, é muito difícil obter esse ordenamento em várias escalas para sistemas artificiais.

Um grupo de pesquisadores do Brasil, Estados Unidos e China acaba de dar um passo importante neste sentido, não só produzindo partículas sintéticas com complexidade superior às biológicas, mas também avançando na compreensão dos fatores envolvidos nessa produção e propondo formas de medir a complexidade.

Em estudo publicado hoje (9) na revista científica Science, os pesquisadores relatam como, a partir de nanoplaquetas formadas por sais de ouro e aminoácidos, conseguiram montar partículas hierarquicamente organizadas com espinhos torcidos e outras morfologias complexas. O truque foi balancear diferentes forças atuantes no processo de construção dessas partículas e, muito especialmente, aplicar a quiralidade do aminoácido empregado — a cisteína — no controle desse processo.

A quiralidade é uma característica de algumas moléculas — e de grande parte daquelas que compõem sistemas biológicos — relacionada à sua forma. A principal analogia utilizada para explicar o conceito é com as nossas mãos: direita e esquerda, praticamente iguais, mas impossíveis de serem sobrepostas com exatidão por serem uma a imagem no espelho da outra. Além de conferir propriedades distintas às versões “direita” e “esquerda” de uma mesma molécula em algumas situações, a quiralidade interfere na interação dessas moléculas com outras partículas e campos que também sejam quirais.

“Nós temos trabalhado com quiralidade de nanomateriais há pelo menos seis anos, e já sabíamos que mudar o aminoácido resultava em estruturas com a mesma complexidade, mas que eram imagens especulares umas das outras. O trabalho publicado agora focou na compreensão de como a informação quiral codificada na molécula de aminoácido menor que um nanômetro poderia ser amplificada e propagada para escalas de tamanho muito maiores”, explica André Farias de Moura, um dos autores da pesquisa, professor do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e pesquisador do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais. “Estamos vendo que o fato de haver quiralidade leva nossos sistemas de estudo a terem propriedades antes presentes apenas nos organismos vivos”, complementa.

O pesquisador reitera que é difícil transferir a informação quiral — mão esquerda, mão direita, ou rotação no sentido horário ou anti-horário — ao longo de várias ordens de grandeza. “Neste caso, partimos de moléculas muito pequenas, cuja informação quiral está codificada em um único átomo de carbono, e essa informação foi transmitida para a próxima escala, gerando folhas torcidas inicialmente com tamanhos da ordem de cinco nanômetros, que cresceram até a ordem de micrômetros e se agregaram em estruturas ainda maiores e mais complexas”, relata.

Entender esse processo de codificação e transferência de informação entre escalas é um dos pontos centrais do estudo. Isto justamente porque o sistema produzido na pesquisa é mais simples e robusto que os equivalente naturais, permitindo maior controle das variáveis e, assim, a ajuda na compreensão de como os sistemas biológicos formam suas estruturas hierárquicas complexas, de onde tiram suas funcionalidades.

“Esses materiais não são específicos para aplicações biológicas, mas, além das aplicações usuais em optoeletrônica, catálise e outras, sempre existe uma aplicação biológica potencial. Como todo e qualquer sistema biológico é por definição quiral, nanomateriais quirais podem agir de maneira mais seletiva se ajustarmos o tipo e o grau de quiralidade para um alvo molecular biológico”, explica Moura. Ou seja, além do melhor entendimento de organismos vivos, outra consequência é o potencial de desenvolvimento de moléculas para tratamento de doenças e, também, produção de vacinas.

“Não podemos usar sabão ou hipoclorito de sódio para matar vírus, bactérias ou fungos quando já estão dentro do nosso corpo, pois não são seletivos e atacariam nossas células também. Mas, com base neste trabalho, podemos afirmar com firmeza que, uma vez compreendidas as interações entre nanopartículas e partículas complexas como os vírus, deveremos ser capazes de vislumbrar nanopartículas sob medida cujo alvo sejam essas entidades microscópicas ameaçadoras”, registra Moura.

“Infelizmente, não existe uma panaceia: este é um empreendimento científico mundial em longo prazo, e nossa contribuição deve abrir novos caminhos de investigação. Mesmo que não ofereçam alívio no presente, esta e outras pesquisas inovadoras vão contribuir para aprimorar nossa prontidão para enfrentar situações como esta no futuro”, conclui.

O artigo intitulado “Emergence of Complexity in Hierarchically Organized Chiral Particles” está disponível no site da Science. Outras informações também podem ser conferidas no texto que preparei para divulgação pela UFSCar.

Dentre os autores brasileiros, além de Moura e ex-alunos seus, também está Sérgio Ricardo Muniz, professor do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP).

O financiamento da pesquisa no Brasil teve recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

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