Tecido desenvolvido no Brasil tem ação contra Sars-CoV-2
Há quem diga que coincidências não existem. Mas é curioso que, exatamente dois meses depois de sumir daqui, tragada por esforços de divulgação relacionados à Covid-19 (dentre eles um podcast publicado diariamente sem interrupção há exatos 93 dias!), retorne justamente complementando o texto com o qual me despedi.
Em 16 de abril, contei como uma empresa de base tecnológica brasileira e um fabricante de brinquedos se juntaram para produzir máscaras reutilizáveis com ação comprovada contra fungos e bactérias. Agora, a mesma empresa, a Nanox, comprovou também a ação dos materiais que desenvolve contra o Sars-CoV-2, vírus causador da Covid-19.
O resultado foi submetido nesta terça-feira (16), em “preprint”, ao repositório bioRxiv, ainda sem revisão por pares, em uma colaboração da Nanox com pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF) e do Laboratório de Química Teórica e Computacional da Universidade Jaume I, na Espanha.
Partículas de prata foram adicionadas a tecidos comuns – o chamado poli-algodão, mistura de algodão e poliéster, recomendado pela Organização Mundial da Saúde para a confecção de máscaras. Experimentos verificaram a integridade estrutural do tecido após a aplicação e, também, a segurança dermatológica do material, que não causou alergias ou irritação na pele nos testes realizados com seres humanos.
E, claro, o mais importante: foi verificada a capacidade do tecido de inativar até 99,99% das partículas virais de Sars-CoV-2 cultivadas em células humanas, em apenas dois minutos. O material também elimina bactérias e fungos, o que evita, por exemplo, a contaminação cruzada.
Os responsáveis pelo estudo vislumbram diferentes possibilidades de aplicação, que vão das máscaras de tecido e roupas hospitalares até artefatos de cama, mesa e banho usados em nossas residências. Negociações já estão em andamento com fabricantes desses produtos, conta Gustavo Simões, CEO da Nanox.
As pesquisas continuarão com testes em outras superfícies, como plásticos. Elson Longo da Silva, Diretor do CDMF, destaca a relevância de uma trajetória de mais de 30 anos na obtenção do resultado em tão curto espaço de tempo no contexto da pandemia. “É a pesquisa básica que resulta na compreensão e no conhecimento a partir dos quais é possível desenvolver um produto. Esta tecnologia só existe agora porque, ao longo do tempo, fomos compreendendo como funcionam os semicondutores”, afirma o pesquisador. “E, neste caso, tivemos a coroação da pesquisa. As máscaras reutilizáveis que já estão sendo comercializadas têm os mesmos aditivos agora testados contra o Sars-Cov-2. Ou seja, fizemos o produto, comprovadamente bactericida e antifúngico, antes mesmo de comprovar também a ação antiviral”, comemora.
As pesquisas realizadas pelo CDMF têm apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), financiadora também de projetos de desenvolvimento e inovação da Nanox. A empresa também recebe recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).